8.6.12

O argumento ad hominem

Em certa política já nem a ordinarice tem limites.
Dom Januário Torgal Ferreira seguramente poderia ter usado a linguagem melíflua típica de um seminarista para se pronunciar sobre uma afirmação do primeiro-ministro o qual, com pose de duvidosa sinceridade, veio elogiar o povo português por sofrer em silêncio os efeitos da política de agressão salarial através dos impostos. Não o fez porque lhe subiu a revolta à boca.
Claro que "mão amiga" logo fez chegar ao jornal com maior difusão nacional o que diz ser o seu salário mensal. Queriam com isso atiçar a revolta do povo contra o clérigo contestante. A lógica era clara: porque, sendo ele padre, não poderia vencer aquele ordenado, deveria viver sim da caixa de esmolas das igrejas; porque ao ganhar o que ganhava era igual aos políticos que criticava.
Na teoria da argumentação há o chamado argumento ad hominem [contra o homem]. Se não puderes destruir o argumento destrói a credibilidade de quem argumenta. A política vive disto. 
Há só uma diferença: quem abriu a mesa deste jogo foram os da política. Fingiram-se contidos e remediados. Desde o Dr. Passos Coelho na primeira viagem ao estrangeiro a fazer de conta que viajava em turística como um exemplo, até às excepções das excepções aos cortes salariais a favor de uns quantos.
Mas há mais: ao fazerem constar quanto ganha um sacerdote que, afinal, pelo cargo que ocupa, está equiparado a major-general, gerando a noção de que é dinheiro a mais, queriam, eles próprios, incluindo os que ganham escandalosamente muitíssimo mais sem razão, esconder-se à sombra daquele que assim queriam emporcalhar.
A regra é simples: quem vive no chiqueiro lança lodo sobre os demais para que, tudo parecendo uma pocilga, não se note, no fundo, a diferença.

P. S. Escrevo isto com a legitimidade de quem já tomou pública posição quanto à ostentação da Igreja que se reclama de Cristo, quanto ao que se passa no IOR. Mas não é isso que está agora em causa. Ser pobre não dá mais razão. Ser pobre de espírito, isso, sim, faz perdê-la toda. A ver se em relação ao rebanho dos que não abrem a boca se publica a lista dos seus ordenados ou da riqueza que nem sabe de onde veio?