26.2.10

Zoologia jurídica

O Direito tem esta coisa notável é ser uma invenção humana. Alguns iludem-se a procurar-lhe uma razoabilidade para além do voluntarismo autoritário, outros uma antropologia que o retire como grandeza da estante trivial das banais coisas sociológicas. Coitados deles.
Vem isto a propósito desta notícia: «Dois jovens de Matsinho, Gondola, centro de Moçambique, foram apanhados pela polícia a manter relações sexuais com uma cabra e agora os donos do animal exigem indemnização e casamento. O caso está em tribunal».
Mas vem sobretudo ainda mais a propósito desta segunda parte da mesma notícia: «"Recebi o caso e já remeti ao tribunal. Mas os jovens serão ouvidos em juízo por furto simples qualificado e não necessariamente por prática sexual, pois a nossa Constituição não acomoda este tipo de acto", disse à Agência Lusa Leonides Mapasse. Fora do processo-crime, acrescentou o magistrado, o ofendido (proprietário da cabra) pode intentar processo civil e moral contra os dois jovens pela prática sexual com a cabra».
Ora ante esta inconstitucionalidade por omissão, segundo a qual a Lei Fundamental de Moçambique não protege as cabras de serem fornicadas, que tolo sou quando me ria, há algum tempo, porque um maduro procurador da República se lembrou de acusar alguém de furto porque as suas ovelhas pastavam no prado de um vizinho. «Crime que se consumava por regurgitação», casquinou o advogado que por causa do chiste levou com uma participação disciplinar.
Ora Portugal tem muitos defeitos. Mas defende melhor as suas ovelhas penalmente do que Moçambique as suas cabras constitucionalmente.