2.6.06

A feira do livra-te

Fui àquela insuportável tristeza que é a Feira do Livro do Porto. Uma tenda gigante, em lona, como nas festas dos casamentos, e dentro dela uns pavilhões feiosos em contraplacado, a maioria sem um toque de graça ou a alegria de uma cor. Lá dentro, esfalfados por um calor insuportável passavam, como sonâmbulos, sem nexo nem destino, uns quantos poucos transeuntes. Transeuntes no sentido etimológico do termo, pois nem leitores se poderia chamar a muitos deles que nem num livro pegavam, nem que fosse para lhe tomar o peso ou ver ao menos se tinha bonecos. A de Lisboa, sendo feira, ao menos é ao ar livre. No mais, é a mesma monotonia, a mesma solidão, o mesmo ar de cidade fantasma. Num país de iletrados tele-espectadores editam-se trinta livros por dia, mas a feira está às moscas. Houve anos em que era o lugar dos despejos do espólio, das sobras, dos restos, do que hoje pomposamente se chama do livro manuseado, forma de as editores de livrarem de monos. Agora já nem isso. Um ar de aflicção desanimada estampa-se no rosto cansado dos vendedores. Resistem a Figueirinhas, a Lello, a Guimarães e a Minerva, a Sociedade de Difusão Bíblica e a barraca dos churros. Até as criancinhas a choramingar cansaço e a pedincharem algodão doce me parecem chatear este ano com menos convicção.